terça-feira, 13 de setembro de 2005

As belezas das curraletas

Como prometemos, voltamos à temática da vinha, como produto turístico.
Na primeira palestra integrada na Semana Cultural dos Vinhos da Macaronésia, evento que passou recentemente por Angra do Heroísmo, Maduro Dias exprimiu algumas ideias sobre o turismo açoriano, chegadas até nós através do Diário Insular, e que nos atrevemos a comentar.
A ideia forte da sua intervenção foi no sentido de garantir que o futuro do turismo açoriano passa pela percepção das razões de existir das coisas, das manifestações culturais e da sua génese. “Temos de saber o porquê das coisas. Temos de saber primeiro produzir para nós, gostar dessas produções e da nossa terra. Só depois estaremos prontos para receber os outros”, explicou o especialista.
Primeira nota para afirmar que, quanto a esta necessidade de existência de conhecimento, de "produtos" com conteúdo e até de puro sentimento nosso em relação àquilo que apresentamos, estamos inteiramente de acordo. Até pensamos que, não fora a necessidade de dinamizar a actividade turística, por questões de diversidade e sustentabilidade económica, (quase) nos bastaria saber e gostar do que produzimos, sem o intuito de o vendermos, directa ou indirectamente, a outrém.
Continuando... numa breve resenha histórica, Maduro Dias abordou a cultura do vinho e da vinha no arquipélago açoriano, explicando porque a existência de determinados condicionalismos climatológicos e geográficos permitiu o desenvolvimento dessa cultura. Mas, segundo o relato do jornalista, o palestrante demonstrou também, em pequenos exemplos, que se têm vindo a criar ideias erradas sobre alguns aspectos que marcam o quotidiano insular e que podem ser usados para o turismo. “Não podemos cair no erro de defender que as curraletas que caracterizam a vinha açoriana são uma manifestação arquitectónica. Elas são o resultado de uma maneira de produzir, são um método e mais nada. As curraletas da nossa vinha são como que um forno”, concretizou, para exemplificar os cuidados que é necessário ter nestas questões.
Aqui é que já não é tão concordante a nossa opinião. Que as curraletas são um método, não discutimos (contudo, não sem afirmar que, no nosso entender, mesmo enquanto técnica, as curraletas se situam muito para além de simples forno - colaboraram na concentração do calor solar mas também protegem as videiras das várias consequências que tanto o vento como a maresia poderiam provocar, numa panóplia de efeitos que ultrapassam as questões térmicas). Não houvera mais a dizer sobre o assunto e já entendíamos que o dito é suficiente para perceber e apresentar as curraletas como mais um elemento (a juntar a tantos outros) na promoção da realidade vitivinícola específica de alguns espaços geográficos açorianos, como pólo de atracção e ocupação de turismo.
Mas mais podemos afirmar sobre as curraletas. Não querendo ser exaustivos ficamo-nos por constatar a sua beleza (imediata, pela imagem estética que formam; significativa, por serem resultado de obras de inúmeras horas e suor que, por artes tamanhas, dificilmente compreensíveis por nós, contribuíram e contribuem ainda para transformar chão de pedra em uvas, e estas em vinho; sócio-cultural, por representarem a forma de estar de um povo, "agarrado" de alma e coração ao sustento que a natureza lhe permitia... e porque não, também, beleza arquitectónica, por não termos dúvidas que, pelo menos para nós, este rendilhado de muros e chão, de pretas pedras composto, ser particularmente belo - uma vez que, de acordo com o dicionário Lello Universal, arquitectura pode ser entendida como "contextura, disposição especial ou simétrica das partes de um composto; estrutura"). Para terminar, apenas um reforço do reconhecimento desta beleza por quem tantas e imensas maravilhas contempla em todo este nosso planeta: "The extraordinarily beautiful humanmade landscape of small, stone walled fields is testimony to generations of smallscale farmers who, in a hostile environment, created a sustainable living and much-prized wine." (negrito nosso, numa frase que integra o documento da UNESCO que classifica, neste caso, a Paisagem da Cultura da Vinha da Ilha do Pico).
Como outras (exactamente as do Pico, mas também as de Santa Maria, por exemplo), as curraletas dos Biscoitos respeitam este quadro de riqueza e beleza - infelizmente cada vez mais maltratadas (mas isso é assunto para outro dia, uma vez que continuamos a prometer que ainda assim não ficamos por aqui em relação a este tema "turístico-vitivinícola": brevemente novos comentários).
Fonte: Diário Insular (6/Setembro/2005).

11 comentários:

Anónimo,  26/9/05 09:53  

Assombrar com paredes altas ou betão armado é mudar os nossos gostos para multiplicar outros prazeres.Temos o exemplo da freguesia do Porto Matins, hoje uma paisagem de betão armado,onde apenas existem hibridos e produtores directos, quando há uns bons anos atrás era uma produtora de vinho de castas nobres entre elas a da Verdelho.Hoje lamenta-se.
Falar só do vinho e não proteger as nobres cepas...é um projecto edificado sobre o solo movediço das conjunturas, e por isso, sujeito a ser derribado pelos ventos das circunstâncias.

Anónimo,  2/10/05 10:43  

Sim é ver os Comentários Região Demarcada de Vinhos dos Biscoitos alguns muito interessantes.

Anónimo,  15/10/05 21:46  

Já vi! São opiniões que se podem ler:
http://acores.sapo.pt/Comentarios/284.html
Google: "Comentários Regiao Demarcada de Vinho dos Biscoitos".

Anónimo,  2/12/05 19:23  

Eram tão interesantes esses comentários?
deviam ser daqueles ... já foram retirados!

Anónimo,  5/12/05 19:08  

Apenas uma sugestão: uma fotografia das curraletas biscoitenses! Eu por acaso conheço-as, mas por esse mundo fora...

José Aurélio Almeida 31/12/05 02:06  

É bem verdade que as conjunturas em muito têm influenciado aquilo que devia ser defendido por razões estruturais: a paisagem vitivinícola biscoitense.

José Aurélio Almeida 31/12/05 02:08  

Sobre os interessantes comentários alusivos à Região Demarcada de Vinho dos Biscoitos convido Iluminata e todos os outros visitantes a ler nota sobre os mesmos, que publicamos no dia 14 de Dezembro.

José Aurélio Almeida 31/12/05 02:10  

Caro Discípulo de Baco: a sua interessante sugestão tem toda a razão de ser. Logo que nos for possível publicaremos uma ou mais fotos de curraletas biscoitenses.
Obrigado.

José Aurélio Almeida 14/7/06 15:40  

Caro Discípulo de Baco:
As primeiras fotos exclusivamente referentes a curraletas dos Biscoitos foram finalmente publicadas em 12 de Julho de 2006 (http://biscoitos-terceira.blogspot.com/2006/07/do-outro-lado-as-curraletas.html).

Anónimo,  26/9/06 18:43  

Obrigado pela primeira fotos das curraletas.
Saudações Báquicas!

José Aurélio Almeida 7/4/07 18:27  

Caro Discípulo de Baco:
É sempre com alegria que correspondemos às sugestões dos nossos visitantes.

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