domingo, 18 de junho de 2006

José Manuel Machado na Saber Açores - I


A 15 de Janeiro 2006 referimos o vinho biscoitense "Pedras de Lobo", produzido pelo senhor José Manuel Machado.

Hoje, conforme prometemos algures, em resposta a um comentário recebido neste
blog, apresentamos uma entrevista a este produtor vitivinícola onde o mesmo se refere ao "Pedras de Lobo" mas também à actualidade e ao futuro da vitivinicultura nos Açores.
Aqui fica então a primeira parte da entrevista realizada por Magda Neto e que, acompanhada por oito interessantes fotografias de Eduardo Borges, foi publicada na revista Saber Açores (Nº72/Novembro 2005, páginas 40 a 42):

"Saber Açores: Há quanto tempo é que está ligado à produção de vinho verdelho?
José Manuel Machado: O vinho verdelho sempre existiu na minha casa, vem desde os meus avós, desde que me recordo. Desde 1984, salvo o erro, eu herdei as vinhas e tive de começar com elas.
S.A.: Que quantidade de vinho é que produz por ano?
J.M.M.: Isto aqui é difícil dizer a produção, porque muitas são as vinhas que ficam na periferia dos Biscoitos, mesmo à beira mar, o que faz a produção depender das intempéries do norte que são ventos muio salgados.
Há factores a ter em conta, mas a produção média é de cerca de 3000 litros.
S.A.: O vinho verdelho é muito procurado?
J.M.M.: É muito procurado. Eu pessoalmente não tenho vinho a não ser da produção do ano passado, todas as produções anteriores esgotaram.
S.A.: Faz exportação do seu vinho ou comercializa-o apenas na Ilha Terceira?
J.M.M.: Exporto para S. Miguel. A procura tem sido sempre maior que a produção. Há um restaurante na Ribeirinha, o único a ter o meu vinho em S. Miguel, e que tem vendido com muita facilidade o meu vinho. O resto é vendido na Ilha Terceira.
S.A.: Quais as maiores dificuldades que sente como produtor vinícola?
J.M.M.: Para mim as dificuldades são poucas, porque de facto não é uma produção grande. Mas há uma dificuldade que tem haver com a deslealdade da concorrência, quando digo isto, baseio-me no seguinte: as adegas cooperativas do Pico, dos Biscoitos e da Graciosa, não sei se são subsidiadas, mas pelo menos são ajudadas, não se financeiramente ou com materiais, mas são ajudadas pelo Estado. Desta forma, as adegas conseguem produzir muito mais barato que o produtor privado, esse é que vai sentir realmente as dificuldades, porque não tem ajuda de ninguém, nem sequer para a caiação da sua adega, enquanto que outros têm apoios para adegas novas.
S.A.: Sendo certo haver falta de mão-de-obra qualificada, como é que faz para trabalhar as suas vinhas?
J.M:M.: Eu tenho uma pessoa que trabalha para mim uma vez por semana, além disso sou eu e o meu filho, os três conseguimos empurrar o barco.
S.A.: A produção de verdelho é, para os produtores privados, dispendiosa? Que factores levam a esta realidade?
J.M.M.: É porque a mão-de-obra fica muito cara, porque a vinha não pode ser mecanizada. A vinha é toda feita em curraletas, normalmente, de 4 por 4 ou de 3 por 3 metros. Portanto, nessas curraletas tem uma média de entre 6 a 9 caldeiras que são cavadas de 2 em 2 anos. A minha vinha tem cerca de 2 mil e tal caldeiras, é mais de um hectare de vinha, e muita caldeira. Depois, há um termo que é único dentro da vitivinicultura, que é o baixar da vinha, em Março, quando começa a ventar tem de se baixar por cima da pedra, por causa dos ventos de Abril e Maio, para não partir os pâmpanos.
Depois essa pedra em Julho serve para levantar a vinha, para que a vinha não esteja em constante contacto com a pedra, fica a uns 10 cm da pedra. É a pedra vulcânica, e algum basalto, que faz com que a vinha no Verão tenha um processo de maturação contínua, por causa do calor que por volta da meia-noite chega a rondar os 30º C, portanto a pedra aguenta o calor todo e dá lugar a uma maturação contínua.
S.A.: O Governo Regional apoia de alguma forma o produtor privado?
J.M.M.: Voluntariamente há sempre um ou outro técnico ou ajudante de técnico que quando há necessidade, por nossa solicitação, nos dá algum apoio. Mas o apoio sobre as vinhas é nulo. Suponho que existem muitas pessoas licenciadas na área das vinhas, mas técnicos penso que não, porque custa dizer isto, mas temos técnicos de secretária, não temos técnicos de campo.
S.A.: Considera que o vinho verdelho está em risco de desaparecer?
J.M.M.: Está! O vinho verdelho está em risco de desaparecer por várias razões, a principal razão é porque os vitivinicultores já tem a sua idade, há uma grande escassez de mão-de-obra e de pessoal especializado para as podas, com conhecimento das castas, porque na poda, a casta sendo diferente, a poda também é diferente e não existem hoje pessoas para este trabalho. Mas isto é só uma parte. A outra parte, o vinho verdelho em si, tal como vi no outro dia numa entrevista, o vinho tinha pouca qualidade numa ilha, não falando em específico do verdelho, porque apanhou as chuvas do fim de Agosto. Afirmaram que não havia problema, porque iam adicionar mosto concentrado, importado, não se sabe de onde, nem de que castas. Logo, desta forma perde-se tudo o que tínhamos de bom, ou seja, genuinidade do vinho das nossas cepas.
S.A.: Poder-se-á dizer que a genuinidade do vinho verdelho está junto dos produtores particulares e não das grandes cooperativas?
J.M.M.: Nas grandes cooperativas não pode ser, até porque quiseram fazer uma reconversão, daquelas reconversões loucas sem saber bem o que é que estavam a fazer, com experiências de introdução de novas castas europeias, quando as nossas já estavam aprovadas há séculos! Estas experiências só serviram para degenerar aquilo que tínhamos, ou seja, a casta verdelho.
Houve pessoas que vieram de fora, penso que utilizam o nome dos Açores para comercializarem o seu vinho, sem que este tenha nada a ver com as castas que os Açores tinham.
S.A.: Há o risco de o consumidor pensar estar a comprar um vinho verdelho genuíno e na realidade não estar?
J.M.M.: 80% a 90% do vinho produzido cá, não é só produzido com casta verdelho, portanto há mais do que uma probabilidade disso acontecer."

Continua brevemente.

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